28 de março de 2009

Clarisse - Auta de Sousa

Mulher com rosas - William Waterhouse

CLARISSE
Auta de Souza

“Não sei o que é tristeza,” ela me disse...
E a sua boca virginal sorria:
Ninho de estrelas, concha de ambrosia
Cheia de rosas que do Céu caísse!

E eu docemente murmurei: Clarisse,
Será possível que tu’alma fria
Ouvindo o choro da Melancolia
O ressabio do fel nunca sentisse?

Será possível que o teu seio, rosa,
Nunca embalasse a lágrima formosa?
Ah! Não és rosa, pois não tens espinho!

E os olhos teus, dois templos de esperança,
Nunca viram sofrer uma criança,
Nunca viram morrer um passarinho!









1 de fevereiro de 2009

Dor Suprema (Rocha Junior)

Bierstadt, Albert - Sunlight and Shadow, 1862, oil on canvas, Fine Arts Museums of San Francisco.


Dor Suprema
Rocha Junior

Tu que não sabes o que é sofrimento
E o sorriso desta lágrima escondida,
Tu que me vês cheio de desalento,
- Folha inda verde num tufão varrida...

Tu que tens, para teu contentamento,
O doce afago de tua mãe querida,
Passa. – Não te preocupe o meu tormento,
Passa. – Deixa que eu chore a minha vida.

Podem ser tristes como um mal sem cura,
A fome, a peste, os vícios, a loucura,
Todas as formas físicas da dor.

Dor nenhuma, porém, tem mais raízes
Que a de viver penando, entre os felizes,
Sem pai, sem mãe, sem nome e sem amor.

21 de janeiro de 2009

Meu Domingo (J. Ananias)


Monet - The Waterlily Pond, 1899, The National Gallery, London.


Meu Domingo
José Ananias



Eu plantei o meu domingo
Nas águas do Lago Verde,
Num recanto à beira-mar
E fiquei de olhos fechados,
Como quem sonha acordado,
Esperando alguém chegar.

Porém o vento, atrevido,
Como quem já tem costume...
Entrou sem pedir licença,
Beijou as águas do Lago
E partiu a murmurar...

Reagindo ao desacato,
Fui ao Palácio do Vento...
E o vento... desesperado,
Voltou, quebrando as vidraças
Das janelas do silêncio.

Mas meu domingo, travesso,
Refestelou-se nas asas
Do tempo que não tem tempo
De sequer fazer promessa
De que vai voltar atrás.

Mas pode ser que aconteça
Que, antes do inverno chegar,
Por milagre, novamente,
Ele germine ou floresça
No Lago Verde ou no Mar.

E que ninguém me pergunte
Porque plantei meu domingo
Nas águas do Lago Verde...
E fiquei de olhos fechados,
Como quem sonha acordado,
Esperando alguém chegar.



(Publicado no Anuário de Poetas do Brasil 1.983)

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Sobre o Autor deste poema, meu querido pai:

Biografia de José Ananias

J. Ananias é o nome literário de José Ananias. Nascido em Piumhi aos 30 de junho de 1914, Minas Gerais. Casou-se em 1.945 com Terezinha Rodrigues Ananias. Pai de 12 filhos.
Autor de vários livros de Poesia, seu nome é constantemente grafado em múltiplas antologias e coletâneas.
José Ananias nutre especial intimidade com a estrutura de sonetos e trovas, escolhendo temas pertinentes e associando simplicidade com argúcia no exercício de transformá-la em matéria poética.
Dirigiu e trabalhou em teatro amador em Caetanópolis, Piumhi e Nova Lima e em rádioteatro, na Rádio Cultura de João Monlevade. Radiofonizou algumas peças, entre elas uma pequena novela.
Músico da “Lira São José” e coral em Nova Lima. Professor, ator, cronista, trovador.
Alguns de seus trabalhos publicados: ”O Cofre de Beatriz”, “A Praça dos Três Poderes”, “Entre o Amor e o Pecado”, “A João Paulo II”, “A Cristo Crucificado”.
Participou do “Anuário de Poetas do Brasil” de 1.979 à 1.985.
Entidades a que pertence (como sócio correspondente): Academia Anapolina de ciências e Letras, Clube de Poesia de Uruguaiana (RS), Centro de estudo e Difusão Cultural “Roma guerra Corrêa” (Uruguaiana – RS), Academia de Trovadores da Fronteira Sudoeste (RS), Clube Internacional da Boa Leitura (Uruguaiana - RS), Associação Uruguaianense de Escritores e Editores (RS), Academia de Letras da Fronteira do Sudoeste (RS), Academia Internacional de Letras “3 Fronteiras” (RS), Federação das entidades Culturais Fronteiristas (RS).
José Ananias reside hoje em Belo Horizonte.





10 de janeiro de 2009

Suplício Eterno (Francisco Cavalcanti Mangabeira)




Suplício Eterno
Francisco Cavalcanti Mangabeira

Não devo amá-la e amo-a com loucura,
Quero esquecê-la e trago-a na lembrança...
Ai quem me livra desse mal sem cura
A que o destino trágico me lança!

Uma nuvem de tédio e de amargura
Cobre-me a loura estrela da esperança...
Tudo cansa por fim na vida escura,
Só este amor infindo é que não cansa!

Se os olhos cerro, vejo-a nos meus sonhos.
Se à noite acordo, sinto que enlouqueço,
De uma angústia nos vórtices medonhos.

E esta morte em que vivo jamais finda,
Pois quanto mais procuro ver se a esqueço
Sinto que a adoro mais ainda!







7 de janeiro de 2009

Despedida (Jader de Lima)

Franz Von Stuck -The Kiss of the Sphinx, 1895, 
oil on canvas, Szépmüvészeti Múzeum, Budapest. 

DESPEDIDA
Jader de Lima

Há muito que era noite: pela estrada
Um silêncio de sono se estendia.
- Tu ias perto de mim triste e calada,
- Perto de de ti calado e triste eu ia.

Era bem tarde, aos lampiões escassos,
Poucos passantes transitavam; montes,
Vales, outeiros se tornavam braços,
Limitando os extremos horizontes.

E nós levávamos no olhar a pena
De que, impiedoso, nos mandasse Deus,
Contra os momentos de alegria plena,
Os maus momentos de dizer adeus.

Ocultas emoções, de parte a parte
Vinham mansas, a furto nos tentar:
Em mim – o medo egoísta de deixar-te,
Em ti – o medo honesto de ficar.

Já no momento da separação,
Eu te falei: – amor, leva contigo
E guarda junto de teu coração
Meu coração de amante, irmão e amigo;

Leva com ele esta promessa linda
De que terei saudades de te ver;
Leva os meus votos de ternura infinda,
Todo o infinito do meu bem-querer;

Leva também meus pensamentos, feitos
Por dar-te culto intenso e permanente;
Graças a ti são nobres e perfeitos,
Pois foste tu que me inspiraste a mente.

E para que viva sempre esta esperança
De uma existência eternamente unida,
Leva a sublime esplendida lembrança
Desta noite – tão nossa – em tua vida.
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
E então, mais bela sob a sombra vaga,
Numa ousadia encantadora e louca
Tu me beijaste e me disseste: - em paga,
Leva o gosto do amor em tua boca!